Bunker da Esquerda

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O Peru violará o direito internacional se aprovar uma lei que deixará de julgar aqueles que cometeram crimes de guerra e de lesa humanidade antes de 1º de julho de 2002, advertiram especialistas em direitos humanos das Nações Unidas em uma declaração divulgada nesta sexta-feira 14.

“A aprovação do projeto de lei 6951/2023-CR, pendente de aprovação no Congresso peruano, impediria o processamento, condenação e sanção penal de pessoas que cometeram tais delitos antes de julho de 2002, impedindo o acesso à justiça, e o direito à verdade e reparação das vítimas”, disseram os especialistas.

Paralelamente, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CorteIDH) pediu ao Estado peruano que “suspenda imediatamente o trâmite legislativo do projeto de lei número 6951/2023-CR”, para “garantir o direito de acesso à justiça das vítimas dos casos Barrios Altos e La Cantuta”, que este tribunal hemisférico está julgando.

Casos arquivados e Fujimori beneficiado

No Peru, a Junta de Procuradores Supremos no Ministério Público afirmou que se a lei for aprovada, cerca de 600 casos deverão ser arquivados e encerrados. “Deixar na impunidade fatos tão graves que afetam o núcleo duro dos direitos humanos passa uma mensagem errada, lamentável, contrária às normas vigentes, nacionais e internacionais”, afirmaram os procuradores em uma declaração.

No caso Barrios Altos, por exemplo, em 3 de novembro de 1991, um comando do grupo Colina do exército irrompeu em um edifício de Lima onde se realizava uma festa, forçou os presentes a lançarem-se ao solo e massacrou pelo menos 15. Em La Cantuta, setor da capital peruana, o grupo Colina sequestrou e assassinou um professor e nove estudantes universitários em 18 de julho de 1992. Em 2007, o ex-presidente Alberto Fujimori (1990-2000), depois de ser extraditado do Chile, foi julgado e condenado a 25 anos de prisão por sua responsabilidade no massacre.

Fujimori, de 85 anos, solto em dezembro passado ao amparo de um indulto concedido por razões humanitárias – a Corte Interamericana se opôs –, e cujos seguidores contam com uma importante bancada parlamentar, seria beneficiado pela lei que está prestes a ser aprovada definitivamente.

Os procuradores também mencionam o caso dos cárceres El Frontón, Lurigancho e Santa Bárbara, onde em função de motins em junho de 1986 foram executados extrajudicialmente mais de 250 internos que eram acusados de terrorismo.

Estatuto de Roma como marco legal

Esses e outros crimes ainda em processo na justiça peruana e internacional ocorreram no contexto da luta entre as forças do Estado peruano e movimentos guerrilheiros de extrema-esquerda. Mas a “Lei que detalha a aplicação e o alcance do delito de lesa humanidade e crimes de guerra (6951/2023-CR)” estabeleceria que podem ser julgados delitos deste tipo só a partir da entrada em vigor no país do Estatuto de Roma que criou a Corte Penal Internacional, isto é, julho de 2001.

O parlamento peruano adotou o texto em primeira leitura em 6 de junho, com 60 votos a favor, 36 contra e 11 abstenções, e sua adoção definitiva poderia ocorrer em segunda votação em questão de dias.

Os especialistas que agem sob o guarda-chuva do Conselho de Direitos Humanos da ONU, na Suíça, afirmaram que “a adoção do projeto de lei poria o Peru em flagrante contravenção de suas obrigações em virtude do direito internacional”. “Os prazos de prescrição não podem deixar de ser aplicados a violações flagrantes do direito internacional dos direitos humanos e a violações graves do direito internacional humanitário que constituem crimes”, afirmaram.

Lembraram que “a imprescritibilidade dos crimes de lesa humanidade é uma norma de ius cogens (que não admite nem exclusão nem alteração de seu conteúdo, razão pela qual anula qualquer ato contrário) e do direito internacional consuetudinário, à qual não se permite nenhuma derrogação e à qual o Peru deve aderir”. Em resumo, o projeto de lei “choca-se com os valores básicos da comunidade internacional, fomenta a impunidade e está em patente contradição com o Estado de direito”, afirma-se na declaração.

Os especialistas da ONU que a assinam são Bernard Duhaime, relator sobre a promoção da verdade, justiça, reparação e as garantias de não repetição, e Morris Tidball-Binz, relator sobre execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias.

Com eles, as integrantes do grupo de trabalho sobre desaparecimentos forçados ou involuntários: Aua Baldé (presidenta), Gabriella Citroni, Grażyna Baranowska, Ana-Lorena Delgadillo Pérez e Angkhana Neelapaijit.

A organização humanitária Human Rights Watch (HRW) garante que o projeto de lei “se enquadra em um padrão de ações do Congresso que fomentam a impunidade e desmantelam o Estado de direito” no país sul-americano. “O Congresso do Peru, em que a metade dos congressistas estariam sob investigação penal, tomou uma série de decisões que socavam a independência judiciária, debilitam a luta contra a corrupção e o crime organizado e desmantelam os processos democráticos e as salvaguardas de direitos humanos”, criticou HRW.

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Muhammad Anza, de Rafah, na fronteira da Faixa de Gaza com o Egito, está procurando há semanas por seu tio Ibrahim Al-Shaer, que desapareceu no início de maio.

“Desde aquele dia, ele nunca mais voltou e não temos notícias dele”, disse Anza, de 19 anos. “Estamos em um estado de grande preocupação. Queremos saber onde ele está, queremos saber se ele está morto, para que possamos enterrá-lo e ter misericórdia dele, ou se ele foi detido (pelos militares israelenses)”.

Quando os militares israelenses lançaram uma ofensiva no leste de Rafah em 6 de maio contra o grupo fundamentalista islâmico Hamas, Al-Shaer e sua família receberam ordens de deixar sua casa na área. Anza disse que seu tio tentou voltar alguns dias depois para recuperar alguns itens que a família não tivera tempo de levar consigo.

A família, conta Anza, procurou hospitais e perguntou sobre o tio a vizinhos que haviam retornado na mesma época para verificar suas casas. Houve bombardeios e ataques aéreos nas proximidades, mas os mortos foram identificados pelos serviços de emergência.

“Entramos em contato com a polícia, a Cruz Vermelha e os comitês locais, mas não sabemos onde ele está, e ninguém sabe de nada”, disse Anza.

A família, como muitas outras, postou uma foto e uma descrição das circunstâncias do desaparecimento de Al-Shaer nas mídias sociais, pois não sabia mais a quem recorrer.

Milhares de corpos não identificados e pessoas desaparecidas

Com a guerra entre Israel e o Hamas em seu nono mês, milhares de pessoas seguem desaparecidas no enclave palestino. Muitas podem estar sob escombros após ataques aéreos. Acredita-se que outras tenham sido detidas em postos de controle israelenses ao tentar retornar ao norte de Gaza ou fugir para o sul.

Embora o número exato de pessoas procuradas seja desconhecido, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) registrou 6,5 mil casos de desaparecidos em Gaza desde o início do conflito.

“Desde 7 de outubro, abrimos linhas diretas para que as pessoas nos liguem se tiverem parentes desaparecidos por qualquer motivo, como uma alegação de detenção ou prisão, se eles foram separados durante as evacuações ou se podem ter sido feridos ou mortos”, disse Sarah Davies, oficial de comunicações do CICV em Jerusalém.

Os corpos que são recuperados e levados para os necrotérios de Gaza nem sempre são facilmente identificados. Em 10 de junho, 9.839 mortos estavam sem identificação, de acordo com o Ministério da Saúde de Gaza, que é controlado pelo Hamas. Outros 27.325 foram identificados.

Mais de 37 mil palestinos morreram até agora na guerra entre Israel e Hamas em Gaza, informou a pasta. Os números não fazem distinção entre combatentes e civis. A DW não pode verificar as cifras de forma independente.

Enquanto isso, de acordo com as Forças de Defesa de Israel, pelo menos 650 soldados foram mortos desde o ataque de 7 de outubro, 298 dos quais morreram durante a operação terrestre em Gaza que começou no final de outubro de 2023.

Davies disse que encontrar os desaparecidos é extremamente desafiador devido à situação em Gaza.

“Embora tenhamos ampla experiência em zonas de guerra, no momento, o rastreamento ativo é impossível”, disse ela.

A Cruz Vermelha geralmente faz o rastreamento ativo, que envolve ir às ruas e bater nas portas das pessoas para fazer perguntas. Mas agora, em Gaza, “as pessoas não têm portas”, disse Davies, “e estão constantemente sendo deslocadas e deslocadas novamente”.

Telefones perdidos e comunicação instável

Linhas de comunicação instáveis e telefones perdidos às vezes dificultam ainda mais o contato com as pessoas. O CICV tem cinco operadores de linha direta em Gaza que recebem informações básicas das pessoas que procuram seus entes queridos, como o local onde foram vistos pela última vez. Em seguida, um especialista em rastreamento liga para as famílias e tenta montar um dossiê.

“Os operadores da linha direta estão ouvindo histórias de famílias, e é de partir o coração”, disse Davies. “Algumas pessoas perderam vários membros da família ou foram separadas de vários membros da mesma família. E não se sabe se foi porque estão sob escombros ou porque perderam o telefone ou o chip do celular, ou se estão em uma área sem conexão e sem internet, mas estão bem”.

Os nomes dos desaparecidos são cruzados com as listas dos poucos hospitais que ainda estão funcionando ou com as listas de detidos por Israel.

Desde 7 de outubro, Israel prendeu milhares de palestinos em Gaza e os levou para centros de detenção por suspeita de conexão com organizações militantes.

Israel detém militantes suspeitos

Nas últimas semanas, surgiram relatos de abusos graves em relação ao centro de detenção de Sde Teiman, no sul de Israel. Os palestinos são detidos de acordo com a Lei dos Combatentes Ilegais, uma legislação alterada pelo Parlamento de Israel e aprovada em dezembro de 2023, que permite que os militares israelenses prendam militantes suspeitos. Para organizações israelenses de direitos humanos, algumas das acusações acabam não sendo verdadeiras e essas pessoas são enviadas de volta a Gaza em algum momento.

Mohammed Al-Madhoun procura o irmão Khalil, um ex-funcionário de 47 anos da Autoridade Palestina em Gaza que foi deslocado do norte do enclave palestino para Khan Younis com sua irmã viúva no início da guerra.

“A esposa e os três filhos do meu irmão permaneceram no norte de Gaza. Ele sentia muita falta deles e tentou várias vezes voltar para o norte, mesmo sabendo que era perigoso”, disse Al-Madhoun. “Em 18 de maio, não o encontrei em sua barraca ao lado da minha”.

O telefone celular de Khalil está desligado desde então, e as buscas em hospitais e por meio da Cruz Vermelha não renderam nenhuma informação. A família também recorreu às mídias sociais, mas, além de um relato de que ele teria sido visto na região central de Gaza, não houve mais nenhum vestígio de Khalil.

Al-Madhoun suspeita que seu irmão tenha tentado atravessar de volta para o norte de Gaza e tenha sido preso pelo exército israelense em um posto de controle ou morto em circunstâncias desconhecidas.

“Estamos em um estado constante de confusão, não sabemos o destino dele e ninguém tem uma resposta. Só esperamos que ele esteja vivo”, disse Al-Madhoun.

A parte mais dolorosa em zonas de conflito em todo o mundo é a incerteza sobre o destino de seus entes queridos, disse Sarah Davies.

“Não é perder a casa, não poder comer ou não saber de onde você tira água”, disse ela. “É ser separado dos membros de sua família sem saber o que aconteceu com eles. Talvez eles estejam vivos, e você tem esperança de que isso aconteça, mas também pensa nos piores cenários possíveis. Não há como encerrar o assunto”.

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Na tarde do dia 10/06, estudantes distribuíram cerca 1.000 panfletos no bairro do Derby, na capital Recife, em apoio à luta dos posseiros de Barro Branco/Jaqueira. A atividade, organizada pelo Comitê de Apoio à Luta dos Posseiros de Barro Branco/Jaqueira, atraiu a solidariedade das pessoas que passavam pela praça do Derby, esperavam ônibus, ou dirigiam pela avenida Governador Agamenon Magalhães.

Os ativistas denunciaram a perseguição da empresa Agropecuária Mata Sul Ltda aos posseiros de Barro Branco, que sofrem ameaças constantes de pistoleiros e têm seus poços d’água envenenados por drones e, mesmo assim, lutam bravamente para retomar a terra que lhes é de direito.

A panfletagem e a sua recepção deixa claro o apoio da população de Recife à resistência dos posseiros e a importância de içar bem alto a bandeira da luta pela terra.

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No último dia 14/06, garis se reuniram na praça da Bandeira, no centro da cidade de Campina Grande, em um protesto para reivindicar melhorias salariais. Os trabalhadores também realizaram agitações com o intuito de tratar com os transeuntes sobre a necessidade da categoria de conquistar um reajuste salarial.

O cargo de gari na cidade é dividido por níveis (B1, B2, B3… e assim por diante). Esses níveis estão atrelados ao valor salarial, quanto mais alto o nível, mais alto o salário. No entanto, eles explicam, que há alguns anos recebem ajustes apenas em relação ao salário mínimo e nunca um reajuste de nível. Em entrevista, um dos garis, que trabalha há mais de 30 anos na profissão, relata que deveria estar num nível B10, mas está no B3 ganhando um salário mínimo, pelo menos R$400 a menos do que deveria.

Além desse remanejamento de níveis, os manifestantes também exigem o reajuste salarial de forma geral, pois muitos dos garis hoje recebem menos do que um salário mínimo.

O protesto se dá no momento mais movimentado do ano na cidade, época das festas juninas, se o serviço de limpeza da cidade já é essencial, no mês de junho fica ainda mais em evidência sua importância. Por isso, em fala a um jornal local (PB Debate), o presidente do Sintab PB reitera “(…) Não tem São João em Campina Grande se eles [os garis] pararem de trabalhar, se eles decidirem fazer uma greve o São João acaba, então a gente pede para que o prefeito possa atender a reivindicação dessa categoria, que é tão somente a correção salarial, porque esses trabalhadores hoje estão recebendo no seu vencimento menos do que um salário mínimo. E também em relação à atualização dos níveis porque tem trabalhador aqui que está há 10, 20, quase 30 anos no nível 1, isso é inaceitável (…)” .

Em depoimento ao AND, ainda detalhou mais acerca das condições de trabalho dos garis, citando a falta e a precarização de seus instrumentos de trabalho, além do alto tempo necessário a ser trabalhado durante anos, sustentado com menos de um salário mínimo, para conseguir uma aposentadoria digna.

O correspondente local de AND esteve presente na manifestação e realizou entrevistas com garis que estavam presentes na manifestação. Confira:

Link para o YouTube.

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Com lucros exorbitantes, que foram aclamados pela especulação financeira, o Banco Itaú registrou um lucro de R$ 9,77 bilhões no primeiro trimestre de 2024 e R$ 35 bilhões no ano passado. Ao mesmo tempo, além das três mil demissões do ano passado, o banco fechou seis agências e cortou mais de duzentos postos de trabalho na Bahia e Sergipe. Vários trabalhadores do setor bancário denunciaram uma “política de gestão extremamente cruel”.

Em Salvador, o Sindicato dos Bancários da Bahia e a Federação da Bahia e Sergipe realizaram uma manifestação no fim de maio, quando a Unidade da Piedade, que empregava diversos trabalhadores e existia há mais de 50 anos, foi fechada. O sindicato denunciou que a unidade tem 8 mil clientes e que entre os 10 funcionários do local, apenas 2 sabiam para onde seriam realocados até a manhã desta terça-feira.

O sindicato também denunciou que os correntistas e beneficiários do INSS serão prejudicados pelos fechamentos das agências, essas pessoas, em maioria idosos, serão transferidos para locais onde não tem atendimento adequado. Os funcionários também já denunciavam “um clima tóxico” e “metas inatingíveis dentro das agências”.

Além dos protestos, os sindicatos se mobilizaram colocando outdoors com o slogan “Itaú feito para demitir”. Os outdoors foram colocados em avenidas movimentadas da cidade como Bonocô, Magalhães Neto, Pituaçu e Itaigara. A movimentação também foi feita como “contrapropaganda”, devido ao fato que o Itaú investe milhões em propaganda com famosos, porém, apresenta um enorme descaso em relação aos seus clientes e funcionários.

A farra bancária sem escrúpulos, sem punição e sem regulamento do Itaú não surpreende, como o Jornal AND já denunciou em 2014: “O Itaú, que desde o gerenciamento FHC se beneficiou fartamente das privatizações de bancos regionais, se tornou a terceira maior instituição financeira do Hemisfério Sul do planeta em novembro de 2008, quando sacramentou a fusão com o antigo Unibanco, em uma manobra monopolista, não obstante aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o Cade – que na teoria existe justamente para coibir práticas monopolistas -, que em muito explica os recordes de agora e que na época foi chancelada pelo então chefe do Banco Central, Henrique Meirelles.”

O que se vê não só na Bahia, mas em todo o Brasil é a repetição de uma farsa, com os bancos sendo beneficiados novamente, podendo manter seus juros altos, lucrando montantes extraordinários em meio à miséria geral da população brasileira. Em 2023, o Supremo Tribunal Federal decidiu que instituições financeiras poderiam tomar imóveis de devedores sem decisão judicial, hoje vemos o Itaú despejando milhares de funcionários nas ruas. Fica a questão, até onde vai o poder dos banqueiros?

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Publicado no dia 18 de junho, o Atlas da Violência 2024 revelou que um homicídio ocorreu a cada 11 minutos no ano de 2022. Alguns dos principais dados revelados pela pesquisa foram: as regiões Norte e Nordeste registraram as maiores taxas de homicídios, jovens entre 15 a 29 anos concentraram quase a metade do número total de 49.409 homicídios do País e violência sexual contra meninas cresceu. Além disso, o Atlas fez relações entre os resultados dos últimos 5 e 10 anos.

O Atlas 2024 traz informações do homicídio segundo cada estado, dados sobre “homicídios ocultos”, violência contra a infância e juventude, mulher, negros, dentre outros. Ele é realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o relatório é anualmente lançado a partir dos dados sobre homicídio do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinam) do Ministério da Saúde.

Principais resultados

A taxa nacional de homicídios a cada 100 mil habitantes foi de 21,7, com 46.409 homicídios no total. A Bahia apresentou a maior taxa, com 45,1 (no total foram 6.776 homicídios). Em seguida está o Amazonas (taxa de 42,5 com 1.771 homicídios) e Amapá (40,5 com 358 homicídios). Em números absolutos, a Bahia está em primeiro lugar, com 6.776 homicídios. Seguido por Rio de Janeiro (3.762), Pernambuco (3.409) e São Paulo (3.212).

Nos últimos dez anos (entre 2012 até 2022) o estado do Piauí registrou o maior aumento das taxas de homicídio, aumento de 47,9%, seguido por Amapá (15,4%) e Roraima (14,5%). Entre os estados que mais reduziram as taxas de homicídio, estão o Distrito Federal (-67,4%) e São Paulo (-55,3%). No período entre 2017 e 2022, os maiores aumentos foram de Piauí (25,5%) e Rondônia (2,8%) e as maiores reduções foram Rio Grande do Norte (-49,1%) e Ceará (-45,9%).

Militares com Bolsonaro impulsionaram letalidade policial

A pesquisa também se debruçou em comparar os dados de 2022 com os anos anteriores, especialmente com os quatro anos do governo militar genocida de Jair Bolsonaro, e registrou que não houve uma diminuição dos homicídios durante o período. O Atlas afirma: “De fato, entre 2019 e 2022, a variação da taxa de homicídio no país foi nula, tendo voltado a aumentar no Nordeste (6,1%) e no Sul (1,2%) e diminuído nas demais regiões, com destaque para a forte redução da letalidade no Centro-Oeste (-14,1%), que manteve o ritmo de queda que ocorria desde 2016”.

Além disso, conclui que não houve “qualquer sinal de melhoria na conjuntura da segurança pública no Brasil no período Bolsonaro”. Destacando o peso dos discursos e ações das autoridades de extrema-direita durante o período, afirmam que a letalidade policial foi intensificada, “como nos mostra o exemplo da Operação Verão na Baixada Santista” em que a Polícia Militar assassinou 77 pessoas.

Mulheres

Comparado com o ano anterior, 12 estados registraram aumento nos homicídios de mulheres e 20 estados superam a taxa nacional de homicídios de mulheres de 3,5 mortes para cada 100 mil mulheres. Os três estados que registraram maior número de mulheres mortas são Roraima (10,4 mulheres mortas a cada 100 mil), Rondônia (7,2) e Mato Grosso (6,2). As taxas de homicídios na Amazônia Legal foram 54% superiores à média nacional. A taxa de mulheres negras é de 4,2 e a de não negras é de 2,5. No estado de Alagoas, mulheres negras tem 7,1 vezes mais chances de serem mortas.

O Atlas também trouxe a informação sobre as formas de violência por faixa etária de meninas e mulheres. Em 2022, o tipo de violência mais frequente que atingiu as meninas de 0 a 9 anos foi a negligência (37,9%) seguido da violência sexual (30,4%). Entre 10 a 14 anos, a violência sexual é o caso prevalente (49,6%). De 15 até 69 anos, é a violência física que mais acomete a população feminina. Acima desta faixa etária, a negligência volta a ser presente.

Estes dados ilustram as consequências da opressão que acomete as mulheres brasileiras. A montanha da opressão feminina atinge especialmente as mulheres trabalhadoras, seja diante da negligência, seja diante da violência sexual e física.

Negros

Em 2022, 35.531 pessoas negras (soma de pretos e pardos) foram mortas, representando 76,5% do total registrados. A taxa de 29,7 homicídios de pessoas negras para cada 100 mil é superior ao índice de assassinatos de não-pretos (10,8). A maior taxa de homicídios contra negros foi registrado na Bahia (51,6), seguida por Amapá (48,8), Amazonas (47,5), Rio Grande do Norte (45,3), Alagoas e Pernambuco (ambos com 45,1).

Crianças, adolescentes e jovens No ano de 2022, a cada 100 jovens (entre 15 a 29 anos) que morreram, 34 foram vítimas de homicídios. Do total de 46.409 de brasileiros mortos, 49,2% eram jovens. A média é de 62 jovens assassinados por dia.

O Atlas também constatou que houve um crescimento do número de crianças e adolescentes vítima de diferentes tipos de violência. Mais de 20 mil crianças entre 5 a 14 anos foram vítimas de violência sexual em 2022, um aumento de mais de 5 mil casos em relação ao ano de 2021.

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Participei em Brasília do Seminário Internacional “Segurança Pública, Direitos Humanos & Democracia”, promovido pelo IREE. Discorri sobre o tema que intitula este artigo. Minha vantagem sobre o grande número de palestrantes ali reunidos, entre 6 e 7 de junho, é ter sido preso comum ao longo de dois anos: 1972 e 1973. Estive em três unidades prisionais de São Paulo: Penitenciária do Estado, Carandiru e Penitenciária Regional de Presidente Venceslau, que ora abriga o comando do PCC.

A ditadura militar decidira afastar três frades dominicanos acusados de “terroristas” do convívio dos presos políticos, após dois anos de encarceramento: Fernando de Brito, Ivo Lesbaupin e eu. Para tentar evitar que a medida repercutisse como perseguição à Igreja, três outros presos políticos foram incluídos no pacote de transferências: Maurice Politi, Vanderley Caixe e Manoel Porfírio.

Minha resposta é “sim” quando me perguntam se é possível ressocializar presos comuns. Não há, contudo, interesse do Estado, como bem explica Michel Foucault em sua obra “Vigiar e punir”. O sistema carcerário brasileiro, que hoje abriga quase 900 mil detentos (cerca de 40% sem condenação formal), é meramente punitivo e vingativo. Submete corpos e não reeduca subjetividades.

Em Presidente Venceslau, onde permanecemos por mais tempo, três iniciativas alteraram os paradigmas da população carcerária: incentivo à criação artística; curso supletivo de ensino médio; e acesso ao rádio. Apesar das resistências da administração penitenciária, criamos oficinas de pintura e grupo de teatro. Os participantes dessas atividades recuperaram a autoestima ao expressar, em telas e interpretações cênicas, o conturbado universo que traziam na subjetividade. Um eficiente processo de autoterapia, pelo qual o ócio carcerário se viu superado por intenso empenho nos diferentes espaços de expressões artísticas.

Surpresa

Para surpresa da direção do cárcere, de 400 presos comuns, 68 se inscreveram no curso supletivo, então denominado madureza. Formadas duas turmas, os seis presos políticos assumiram os conteúdos didáticos e pedagógicos. Os exames eram aplicados por professores vindos de fora, o que assegurou validade oficial ao curso. As conversas da população carcerária, até então centradas em delitos e pornografia, passaram a ter como referências a história do Brasil, contos de Machado de Assis ou a Tabela Periódica. Aumentaram os pedidos de livros à biblioteca e o acervo foi ampliado graças à mobilização de amigos. Érico Veríssimo nos enviou meia dúzia de grandes caixotes com farta literatura.

A muito custo convencemos o diretor da penitenciária a permitir que cada um dos 400 presos tivesse rádio na cela individual. Descontou-se o valor do aparelho do pecúlio prisional assegurado por lei a cada encarcerado. O que não sabemos é se a compra por atacado correspondeu ao valor que pagamos pelo produto… Favorecer o acesso ao rádio foi como abrir janelas nos muros da penitenciária. Diante da diversidade de informações, as conversas deixaram de ter como tema central a criminalidade.

Tivesse o governo interesse e empenho em ressocializar os detentos, transformaria nossos cárceres em grandes oficinas de habilitação profissional. Os presos trabalham, mas em atividades mecânicas, sem criatividade. Conheci um, em Presidente Venceslau, que há oito anos limpava o mesmo corredor… Outro trabalhava na alfaiataria, mas não sabia fazer uma calça ou camisa. Sua tarefa era pregar botões… Em sistema de cooperativas, como faz o Instituto Humanitas360, envolvendo inclusive as famílias das detentas, é possível propiciar qualificação profissional, produção de renda e resgate da autoestima cidadã.

Medidas correlatas

Há, no entanto, que adotar medidas correlatas ao sistema prisional, como evitar a privatização dos cárceres (onera-se o custo do sistema e favorece a corrupção entre governantes e empresários); descriminalizar o uso e o comércio de drogas; desmilitarizar as polícias; combater a tortura e o racismo; qualificar os carcereiros; limitar as prisões cautelares; aprimorar o sistema de saúde física e psíquica dos encarcerados; e favorecer a saídas temporárias, agora vetadas pelo atual Congresso, embora seja ínfimo o número de infratores dessa medida restaurativa.

Se tais atitudes não forem tomadas, nosso sistema prisional continuará a ser antro de corrupção e tortura, e escola de reincidência criminal. E nós, cidadãos e cidadãs livres, obrigados a autoencarceramento, retidos em casa por medo das ruas, acossados pelo medo, ameaçados por transtornos psíquicos e síndrome do pânico.

O mais importante, porém, é diminuir a criminalidade. Para isso a receita é óbvia: a redução da desigualdade social; universalização e qualificação do sistema educacional; pleno emprego; e cultura da ética.

O que não interessa às forças obscurantistas da acumulação privada do capital.

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Em maio, com as eleições europeias chegando, Madri acolheu dois eventos organizados pela ultradireita. Um, realizado no palácio de Vistalegre, Madrid Europa Viva 24, organizado por Vox e os Conservadores e Reformistas Europeus (ECR), teve uma ampla repercussão midiática. O líder da extrema direita espanhola, Santiago Abascal, reuniu em um mesmo cenário políticos mundiais afins a suas ideias: o presidente argentino, Javier Milei; o primeiro-ministro da Hungria, Víkto Orbán; o ex primeiro ministro polonês, Mateusz Morawiecki; e a presidenta do Governo italiano Giorgia Meloni, entre outros.

A outra atividade, quatro dias mais tarde, aconteceu no hotel Intercontinental Madrid. O Fórum Europeu da Liberdade não contou com nenhum líder mundial. Tampouco com câmeras de televisão. Seus expoentes, desconhecidos da opinião pública, foram empresários, economistas e diretores de organizações e associações ligadas ao ultraliberalismo, lobistas, em sua maioria, das formações que participaram do primeiro evento.

O organizador deste fórum foi a Atlas Network, uma associação global que aglutina dezenas de think tanks libertários, com muita influência nos Estados Unidos e na América Latina, que, em silêncio, começa a abrir suas asas sobre a Europa ante o auge e consolidação de partidos ultraconservadores.

“Ambos os acontecimentos são um símbolo de uma extrema-direita em ascenso na Europa em nível eleitoral, mas também — e talvez igualmente importante — da perspectiva da ‘batalha de ideias’”, advertem os pesquisadores franceses Lora Verheecke e Olivier Petitjean, integrantes do Observatório Multinacional, um laboratório de controle corporativo, autores de um informe que traça uma bem documentada radiografia desta organização.

Atrás da Atlas Network, revela a investigação, encontram-se multimilionários e fundações de direita como a Fundação Koch, a Heritage Foundation e Templeton, assim como grandes corporações de setores como o petróleo, o tabaco e o setor farmacêutico. A difusão do negacionismo climático e a instalação no debate público de uma agenda contra as políticas verdes são dois objetivos centrais desta organização.

“A Rede Atlas apoia, nutre e promove seus sócios em toda a Europa. Onde quer que se sinta sua influência, promove uma série de políticas de ultra livre mercado que inevitavelmente implicam cortes de impostos para os ricos, cortes do gasto público, desregulamentação massiva e oposição à justiça climática, respaldados por financiadores com grandes recursos, mas em sua maioria ocultos. As políticas que promove na Europa não são uma exceção e refletem uma aliança similar entre políticas neoliberais extremas e causas conservadoras radicais, como se vê nos Estados Unidos”, explicam os pesquisadores.

Na península ibérica, conta o jornalista Danilo Albín, a rede Atlas Network encontrou “espelhos em que se olhar”: o ex presidente José María Aznar e Isabel Díaz Ayuso

Os tentáculos desta rede já operam na Espanha. O Fórum Europeu da Liberdade foi coorganizado pela Fundação para o Avanço da Liberdade (Fundalib). Em 2019, esta organização fez uma aliança com outro think tank espanhol, o Instituto Juan de Mariana (JMI), também sócio da Rede Atlas, descrita como “o epicentro do obstrucionismo climático no sul da Europa”.

Na península ibérica, conta o jornalista Danilo Albín, de Público, a rede Atlas Network encontrou “espelhos em que se olhar”: o ex-presidente José María Aznar e a presidenta da Comunidade de Madri, Isabel Díaz Ayuso. Ambos participaram de eventos organizados por este lobby na América Latina. Ayuso, por exemplo, participou em 2021 de conferências patrocinadas por membros de Atlas Network no Chile e no Equador, nos quais criticou as “falsas bandeiras feministas que não são feminismo” e enalteceu seu slogan “comunismo ou liberdade”.

Desregulamentar a Europa

Fundada em 1981 pelo empresário britânico de fábricas de baterias Antony Fisher, a Atlas Network pretende cobrir o mundo com think tanks libertários, inspirado no Instituto de Assuntos Econômicos (IAE) no Reino Unido, que contribuiu para a vitória de Margaret Thatcher. Segundo seu informe anual de 2023, conta com 589 sócios em 103 países e um orçamento de 28 milhões de dólares.

Não é coincidência, explica-se na pesquisa, que este fórum esteja “tão ativo” na Europa. Porque, embora a União Europeia sempre tenha se baseado nos princípios do livre comércio, “também foi fonte de importantes regulamentações em muitas áreas, que os libertários sempre desprezaram”.

“Com o ascenso da extrema-direita em toda a Europa e a eleição de líderes que simpatizam com suas ideias em vários países, como Itália e os Países Baixos recentemente, veem uma oportunidade para impulsionar a Europa para políticas ainda mais desregulamentadoras e menos protetoras”, enfatizam os autores.

A capital da Espanha é hoje “um epicentro desta batalha de ideias”, o que reforça a ideia de Madri como a nova Miami, “um ponto de encontro libertário que une Europa, EUA e América Latina”, diz Guillermo Fernández

Em Bruxelas, Atlas Network tem como sócios influentes e organizações ultraconservadoras como o Centro de Informação sobre Política Europeia (Epicenter), uma fonte de consulta de muitos meios de comunicação. Todos os anos, publica uma classificação dos chamados “Estados-babás”, um ranking que denuncia os países que “restringem” a liberdade individual de seus cidadãos, regulando, por exemplo, o álcool e o fumo. Em 2023, este lobby considerou ter chegado a 250 milhões de cidadãos europeus e ter sido mencionado mais de 300 vezes na mídia.

Outro aliado é Consumer Choice Center (CCC), um think tank que opera a favor da agroindústria. Sua cara visível na Europa, o empresário Bill Wirtz, muito ativo em redes sociais, descreve os ecologistas como “teóricos da conspiração”. “Quando Bill Wirtz entra no twitter, produz um podcast ou participa de debates, é considerado um simples consumidor. Isto permite que mensagens idênticas às da indústria se repitam por meio de canais “não comerciais”, criando o tipo de câmara de eco aparentemente independente que é uma característica chave do enfoque de Atlas Network”, afirma esta investigação.

A CCC lançou meses atrás uma campanha e um site para “ajudar os eleitores europeus a navegarem pelo complexo panorama dos candidatos políticos que competem por assentos no Parlamento Europeu em 2024”. No item sobre preços dos combustíveis e mudança climática, só uma resposta dá 10 pontos: “Reduzir os impostos dos combustíveis”. Aumentar estes impostos ou promover o transporte público ecológico e alternativo não dá nenhum ponto aos candidatos.

Em questões climáticas, o Greenpeace denunciou em 2010 esta rede por ter financiado uma multidão de organizações que agem como uma “câmara de eco” para amplificar artificialmente mensagens que sabotam a ação climática e a credibilidade da investigação científica sobre o tema. Para os analistas Lora Verheecke e Olivier Petitjean, com o ascenso dos partidos de extrema-direita em toda a Europa, “há razões para temer que depois das eleições de junho a UE se incline ainda mais para uma agenda política conservadora, anticlimática e antirregulamentação”. Neste sentido, a Rede Atlas, em seu afã de fazer retroceder a justiça social e as políticas ambientais progressistas, “parece estar buscando novos aliados e mais portas abertas na UE”.

“Com o Fórum Europa Liberdade realizado recentemente em Madri, onde estiveram representadas 191 organizações de 47 países, demonstrou sua crescente força na Europa e também em Bruxelas. Depois da Argentina, do Reino Unido e muitos outros países, agora tem a UE na mira”, concluem.

França, a prova piloto

Por meio de cinco poderosos sócios, Altas Network influi há mais de uma década no mapa político francês, sobretudo por sua alta visibilidade nos meios de comunicação. Os sócios da rede são: a Fundação Ifrap, Taxpayers Associés, IREF, o Instituto Molinari e IFP. “Todos preferem permanecer discretos sobre seus vínculos com a rede estadunidense. Todos eles têm muitos vínculos entre si e com empresários e pessoas ricas, assim como com todos os matizes da direita e da extrema-direita francesas”, explica a pesquisa deste laboratório gaulês.

Ifrap, por exemplo, foi fundado graças a uma importante doação da Fundação Heritage, muito próxima da extrema-direita de Marine Le Pen. Sua porta-voz, Agnès Verdier-Molinié, formou-se em vários think tanks estadunidenses, todos satélites de Atlas Network.

Já o Instituto de Pesquisas Econômicas e Fiscais (Iref) ou o Instituto Molinari alimentam constantemente “a câmara de ressonância libertária nos meios de comunicação com ideias similares: críticas aos impostos e diatribes contra um suposto ‘ódio aos ricos’, oposição às políticas climáticas ou apelos à privatização dos serviços públicos”. Frequentemente, nos debates midiáticos, “apresentam-se como especialistas independentes e apolíticos”.

“Estamos falando de multinacionais que investem uma grande quantidade de dinheiro para que as democracias não limitem seus lucros ainda que isto implique em suprimir direitos e aumentar a desigualdade”, afirma Miquel Ramos

“Ainda que continuem sendo minoria na opinião pública, seus porta-vozes estão cada vez mais presentes nos meios de comunicação e algumas de suas propostas se encontram nos debates e nas decisões políticas”, adverte o trabalho.

Desde seu nascimento, a Atlas também se beneficia de fundos de um doador chave: o grupo Michelin. Jean-Claude Gruffat, único membro francês do conselho de administração da rede, é um exemplo dos vínculos entre o mundo empresarial, a extrema-direita e este influente think tank. Trabalhou por mais de 40 anos em finanças, no banco IndoSuez, depois no Citigroup e no Galileo Global Advisors, antes de terminar como diretor-geral de Weild & Co em Nova York. Este cargo lhe permitiu viajar pela Ásia, Oriente Médio, Europa e América do Norte e “construir uma grande rede de contatos em muitos países”. Fundou o Instituto das Liberdades, um dos think tanks franceses mais vinculados a Atlas Network. Atualmente, o Instituto é presidido por Charles Gave, um milionário denunciado pelo suposto financiamento ilegal de campanhas da extrema-direita.

O nexo com Milei

A Atlas Network patrocina dois dos grandes think tanks que ungiram a candidatura do presidente argentino Javier Milei: a Fundação Atlas, com escritórios em Puerto Madero, em Buenos Aires, e a Fundação Liberdade, com sede em Rosario, Santa Fé.

O negacionismo de La Libertad Avanza, o partido deste mandatário latino-americano, inclui a privatização dos recursos naturais do país, uma política que o líder ultra libertário pensa pôr em prática na segunda parte de seu mandato.

O movimento “libertário” vai um passo além e propõe, sem meias-medidas, privatizar o Mar Argentino, desta forma dando luz verde definitiva à exploração petroleira nas águas nacionais

O jornalista ambiental argentino Maico Martini revelou no ano passado o estreito vínculo entre os irmãos Koch, maiores investidores desta rede, a segunda família mais rica dos Estados Unidos, com um patrimônio estimado de 100 bilhões de dólares segundo Forbes, e Milei.

As indústrias Koch já não se dedicam só ao petróleo: diversificaram suas atividades para a química, a mineração, o papel e as finanças. “Há anos que o setor petroleiro voltou seus olhos para o Mar Argentino”, conta Martini. Durante o Governo de Mauricio Macri foi outorgado a diferentes empresas permissões para buscar jazidas petrolíferas nas águas nacionais. A administração do ex-presidente Alberto Fernández amparou a decisão de seu antecessor.

O movimento “libertário” vai um passo além e propõe, sem meias-medidas, privatizar o Mar Argentino, dando assim luz verde definitiva à exploração petrolífera nas águas nacionais. “Por que as baleias estão em extinção, ou os elefantes? A diferença é a cerca. Por que as galinhas e as vacas não se extinguem? Porque há um proprietário”, justificou em campanha o hoje deputado nacional Bertie Banegas Lynch.

Em janeiro, The Guardian publicou um artigo intitulado “O que vincula Rishi Sunak, Javier Milei e Donald Trump? A obscura rede por trás de suas políticas”. Para o jornal britânico, “Milei está tentando o que os conservadores fizeram no Reino Unido durante 45 anos”, um projeto político influenciado por uma série de think tanks neoliberais em nível global, Atlas Network, um “organismo coordenador global que promove em termos gerais o mesmo pacote político e econômico em todos os lugares onde opera”.

“Madri é hoje um epicentro desta batalha de ideias”

Guillermo Fernández Vázquez é licenciado em Sociologia, Filosofia e doutor em Ciência Política pela Universidade Complutense de Madri. É um dos acadêmicos que mais pesquisou a ultradireita europeia.

Em diálogo com El Salto, afirma que é “chave enfocar a influência dos think tanks libertários na extrema-direita ocidental”. Adverte que “Milei não é um caso raro”, ao contrário. “É com Milei que avança o futuro político da extrema-direita, que passaria do modelo da década passada ligado ao Estado de bem-estar chauvinista a uma nova hegemonia ideológica que hoje os libertários estão conquistando”, analisa.

A seu ver, os dois eventos em Madrid “não são casualidade”. A capital da Espanha é hoje “um epicentro desta batalha de ideias”, o que reforça a ideia de Madri como a nova Miami, “um ponto de encontro libertário que une Europa, Estados Unidos e América Latina”.

Para este especialista, o interesse de Altas Network na Europa “vai ter efeitos sobre a tendência, a oferta e os discursos políticos da ultradireita”. “De algum modo, o aparecimento deste lobby na Europa está deixando muito obsoleta a velha fórmula vencedora da ultradireita, o estado de bem-estar chauvinista. As forças renovadas do discurso libertário e seus lobbies estão deslocando o eixo da ultradireita”.

“Com esta onda ultradireitista em nível continental, a rede terá em Bruxelas muito mais gente à sua disposição para seguir avançando em sua batalha cultural”, diz Miquel Ramos

Esta “onda ultraliberal” tem algo de “inesperado e contraintuitivo”, acrescenta Fernández. “Com a pandemia houve um consenso de que viriam modelos com Estados mais fortes e a sustentabilidade ambiental, que a pandemia matava definitivamente o neoliberalismo. O que estamos encontrando três anos depois do confinamento é justo o contrário: as ideias libertárias têm mais força do que nunca”, reflete.

O “perigo” destes lobbies, acrescenta, é “sua capacidade transversal de penetrar por meio de prêmios, bolsas e fóruns muito além das redes habituais da ultradireita tradicional”. Isto é: seus tentáculos são “muito mais eficazes” que os que até agora estavam utilizando as usinas de ideias de partidos como Vox.

A mesma reflexão faz Miquel Ramos, jornalista e pesquisador especializado em extrema-direita. Ramos explica que o avanço desta rede é “um claro perigo para a democracia”. “Estamos falando de multinacionais que investem uma grande quantidade de dinheiro para que as democracias não limitem seus lucros ainda que isto implique em suprimir direitos e aumentar a desigualdade. Um de seus êxitos é, justamente, saber mascarar muito bem suas proclamações e campanhas para que as correntes políticas e a opinião pública lhes sejam favoráveis. Isto é jogar muito sujo na democracia”, diz.

Ramos esclarece que “Atlas Network já tinha posto algumas fichas na Europa” e que sua penetração não é nova. O problema é que agora, com esta onda ultradireitista em nível continental, “a rede terá em Bruxelas muito mais gente à sua disposição para seguir avançando em sua batalha cultural”.

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A tragédia climática socioambiental que chegou ao Rio Grande do Sul, em maio deste ano, impactou 1.371 escolas da rede pública do estado. Muitas destas perderam seus acervos bibliotecários. Com isso, deixando muitos estudantes sem material literário para a volta gradativa das aulas. A Subsecretaria de Desenvolvimento da Educação da Secretaria da Educação (Seduc) estima que será necessário recompor o acervo mínimo em 138 bibliotecas escolares destruídas pelas enchentes.

Diante desta realidade o CPERS-Sindicato lançou a campanha "Esperança nas Estantes", que tem como objetivo a arrecadação de livros infantis e infantojuvenis para as instituições atingidas pelas enchentes.

"Há anos, desde o governo Sartori e mais ainda no governo Leite, há um desmantelamento das bibliotecas nas escolas por não ser prioridade dessas gestões. Uma biblioteca escolar bem aproveitada pela escola torna-se uma extensão da sala de aula e um grande aliado dos professores. Isto porque as bibliotecas escolares prestam ainda uma enorme contribuição como espaços de lazer, onde os alunos leem por prazer, tornando-se leitores para toda a vida", ressalta a tesoureira do CPERS, Rosane Zan.

Além de ser porta de entrada ao mundo literário, as bibliotecas escolares, conforme ressalta Rosane, são instrumentos de desenvolvimento do currículo, que permite o fomento à leitura e à formação de uma atividade científica.

"Torna-se, portanto, elemento crucial na formação do indivíduo para a aprendizagem permanente, estímulo à criatividade e à comunicação. Os livros apoiam o desenvolvimento da linguagem, a ampliação de vocabulário, a criatividade e a descoberta do mundo imaginário, por exemplo. Por isso a importância da campanha", pontua.

Conforme frisa a dirigente, a educação deve resgatar o repertório que toda história infantil oferece para apresentar às crianças as diferenças entre as culturas e as pessoas.

As doações podem ser feitas na sede do sindicato, em Porto Alegre, localizada na Avenida Alberto Bins, nº 480, e nos 42 núcleos, em seus respectivos municípios.

Impacto

"Muitas escolas vão precisar reconstruir suas bibliotecas. Nós perdemos um terço, mas tem escolas que perderam tudo", destaca o diretor do Colégio Estadual Coronel Afonso Emílio Massot, bairro Azenha, João Alberto Rodrigues.

A escola de quatro pavilhões está desde o dia 31 de maio em processo de limpeza, com remoção da lama, de entulhos, das coisas que foram danificadas ou perdidas com a água. De acordo com Rodrigues, toda área do térreo foi afetada, sendo oito salas de aula, duas de audiovisual, refeitório, parte administrativa e a biblioteca.

"O mobiliário e muitos outros itens, armários, prateleiras, móveis, enfim, perderam-se com a enchente. No momento, a escola está nesse processo da limpeza e aguardando o início da manutenção da parte elétrica, que é outro problema e que é um receio que temos que demore ainda mais para abrir a escola, retornar as atividades presencialmente com os estudantes", relata.

Quanto aos danos à biblioteca, o diretor comenta que não tem ainda um cálculo preciso do prejuízo. "Na biblioteca se perderam mesas, cadeiras, alguns conjuntos, estantes. Mas isso são danos pequenos se comparado ao dano maior, o principal, que são os livros. Perdemos cerca de um terço, ou um pouco mais, do acervo da biblioteca, principalmente literatura variada. É algo que vai demorar para repor e que causa um dano gigantesco, pensando quando retornarmos presencialmente."

Para além da questão do acervo, a biblioteca, pontua Rodrigues, também servia como uma espécie de acolhida e descanso dos estudantes. "Muitos a procuravam por sua estrutura, por aquilo que ela poderia oferecer. Muitos estudantes procuravam para ficar ali conversando, um momento de lazer, lendo, retirando o livro. Muitos professores levavam os estudantes de suas turmas para a biblioteca para uma atividade de leitura."

A biblioteca, prossegue do diretor, possibilita um momento de contato mais imersivo no ambiente de livros. "Sabemos que muitos estudantes não têm nas suas residências livros, que dirá uma estante, uma prateleira com livros. Então ficar no ambiente rodeado de livros já é um estímulo à leitura."

A administração da escola está fazendo um boletim de ocorrência referente às perdas, às baixas do patrimônio. E segundo o diretor, mesmo que limpa, ainda há um pouco o cheiro da lama. "Vai permanecer por um tempo, né? A biblioteca ainda está descaracterizada. Está sem mesas, cadeiras. Esperamos que o mobiliário possa chegar antes das atividades presenciais. Mas se o mobiliário perdido for reposto apenas após a volta do presencial, vamos ter esse impacto visual por parte dos estudantes."

Conforme afirma Rodrigues, o principal desafio agora é pensar como manter-se em contato com os estudantes, "como evitar que esse vínculo com a escola, que muitas vezes é frágil, por vários fatores, fique ainda mais frágil, estique e possa até arrebentar".

"Nossa escola está acabada! Toda a nossa história foi embora"

O desabafo é da professora de Geografia da EEEM Cristóvão Colombo, no bairro Sarandi, Maria Angélica Simioni Lazzaris. O bairro foi um dos mais atingidos da capital gaúcha.

Atualmente trabalhando na supervisão da escola, ela conta que a escola é totalmente térrea e o volume de água ocupou seus espaços. O nível chegou a mais de 1,70m. "Não só nossa biblioteca, o Banco de Livros, como em toda a escola houve perda total. Mais de 30 dias debaixo d'água, o que a enchente não danificou, o mofo e a umidade se encarregaram de exterminar", expõe.

Somente nesta terça-feira (11) foi possível entrar na escola e fazer a primeira limpeza. "Sobre custos, nem pensamos ainda. Tínhamos muitos livros, a maioria antigos. Mas também livros que recebemos mais recentemente. Mapoteca, dicionários também compunham o espaço da nossa biblioteca", conta.

Angélica pontua que uma parcela dos alunos não se preocupa muito com os livros, se adaptou inclusive à leitura por meio digital, mas há outros estudantes, leitores vorazes, que ficaram muito chateados. "Mas o interessante é que mesmo para aqueles que não leem muito, o espaço da biblioteca é muito importante no contexto da escola", afirma.

"Em qualquer momento, campanhas para abastecer bibliotecas são muito importantes. Neste que estamos vivendo agora, então, nem se fala! É vital para a escola recuperar todos seus espaços, inclusive a biblioteca."

A expectativa, finaliza a professora, é ver todo o montante de recursos destinados à educação pós-enchente chegar ao chão da escola.

O recurso a que a supervisora se refere, é o anunciado pelo governo do estado no dia 4 de junho. O governador Eduardo Leite anunciou recursos extras no valor de R$ 46,6 milhões para a educação. Conforme expôs o Executivo estadual, do valor anunciado, R$ 22,1 milhões serão repassados por meio do Agiliza, para serem utilizados em ações de investimento e custeio, contratação de serviços e compra de materiais de consumo. Os repasses para as escolas vão variar entre R$ 20 mil, R$ 40 mil e R$ 80 mil, dependendo do impacto em cada uma das 636 instituições escolares afetadas.

Outros R$ 18,2 milhões serão usados para aquisição de alimentação escolar, beneficiando as 625 escolas mais afetadas e aquelas que estão servindo de abrigo.

Para a reposição de mobiliário, serão destinados R$ 6,3 milhões, com 8 mil conjuntos de classe já adquiridos para entrega imediata em 42 escolas de 32 municípios atingidos.

Campanha Mochila Cheia

Além disso, a Secretaria da Educação (Seduc) iniciou, nesta segunda-feira (10), a Campanha Mochila Cheia, iniciativa de doação de livros e materiais escolares para crianças e jovens da Rede Estadual afetados pelas enchentes. "A ação tem como objetivo arrecadar o maior número possível de itens escolares, com previsão de que sejam compostos cerca de 100 mil kits completos e em boas condições para volta às aulas", destaca a pasta.

Entre os materiais sugeridos para doação estão caderno, conjunto de lápis, apontador, giz de cera, caneta, estojo, lapiseira, calculadora, réguas e squeezes. Também são aceitos livros de literatura infanto-juvenil.

A Subsecretaria de Desenvolvimento da Educação da Seduc estima que para recompor o acervo mínimo em 138 bibliotecas escolares destruídas pelas enchentes são necessários 48.662 títulos de literatura brasileira e universal em bom estado. De acordo com a pasta, a intenção é arrecadar aproximadamente cinco exemplares por aluno e atingir a meta de 245.090 livros doados. A lista completa dos livros está disponível no site da Seduc.

Em Porto Alegre, as doações podem ser feitas na Escola Estadual Maria Thereza da Silveira (rua Furriel Luíz Antônio de Vargas, 135, bairro Bela Vista), primeiro ponto de coleta da campanha. O espaço para doações funciona das 10h às 16h, com equipes da Seduc que recebem os materiais e preparam os kits.

No Interior, as doações serão organizadas pelas Coordenadorias Regionais de Educação (CREs). Os interessados em participar da Campanha Mochila Cheia devem entrar em contato com a CRE de cada região para obter informação sobre os locais onde os itens estão sendo recebidos.

O Executivo lançou no dia 5 uma plataforma que mostra a situação de todas as escolas da rede estadual, e como elas foram impactadas pela enchente. O estado tem 2.338 escolas públicas estaduais, com mais de 741,8 mil estudantes matriculados em 2024. Mais de 97% já retornaram suas atividades.

Fonte: BdF Rio Grande do Sul

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“O lobby do agronegócio tem sido o mais pesado de todos, e depois vem o da indústria de alimentos”, confidenciou o secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, durante reunião com representantes da sociedade civil em 2023, quando se iniciaram as conversas sobre a proposta de revisar a política de impostos no Brasil. Desde então, os dois setores citados pelo secretário têm trabalhado juntos em uma pauta comum: frear medidas que buscam reduzir o consumo de ultraprocessados no país.

Eles defendem que uma espécie de “terrorismo nutricional” estaria em curso e os produtos industrializados do tipo, que incluem biscoitos, salgadinhos, macarrão instantâneo, entre outros, estariam sendo “cancelados” injustamente. A “ditadura do saudável” é vista como uma ameaça a empresas tradicionais cujos produtos são ricos em açúcar, gorduras ou sódio, que, em excesso, trazem prejuízos à saúde.

Por que isso importa?

Indústria usa discurso já contestado pela ciência para subestimar danos à saúde provocados por alimentos ultraprocessados e influencia decisões políticas como forma de evitar desestímulos ao seu consumo.

Para entender como funcionam as forças que operam nos bastidores do Congresso Nacional e do governo federal, é necessário responder a três questões fundamentais:

5 características para identificar ultraprocessados

1 - Formulações industriais com muitos ingredientes, etapas e tipos de processamento

2 - Contêm pouca ou nenhuma presença de alimentos in natura

3 - Recebem aditivos químicos que modificam as características sensoriais do produto

4 - São artificialmente mais palatáveis e atraentes

5 - Apresentam altos níveis de gordura, açúcar e sódio, que, em excesso, fazem mal à saúde.

Indústria quer ultraprocessados na cesta básica e imposto zero na Reforma Tributária

A pressão do agronegócio e da indústria de alimentos sobre o governo federal surtiu efeito. Contrariando recomendação do Conselho Nacional de Saúde, vinculado ao Ministério da Saúde (MS), e do Ministério de Desenvolvimento Social (MDS), os ultraprocessados, com exceção das bebidas açucaradas, ficaram de fora do imposto seletivo – dispositivo criado como forma de desincentivar o consumo de produtos prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. Mas o empresariado quer mais: ampliar a lista de alimentos que vão pagar alíquota reduzida ou zero.

“Nós gostaríamos que os ultraprocessados fossem tributados, entrassem no imposto seletivo, mas houve uma avaliação de governo que entendeu que, no momento, só daria para contemplar as bebidas açucaradas, o que nós já consideramos um avanço”, afirmou a secretária nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do MDS, Lilian Rahal, em entrevista à Agência Pública.

Já o secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, justificou que “o grosso dos alimentos ultraprocessados estão na alíquota cheia e já têm uma diferença de tributação bastante importante [em relação aos itens da cesta básica, que serão desonerados]”.

Desde que a proposta do governo federal de regulamentação da Reforma Tributária passou a tramitar na Câmara dos Deputados, em abril, o foco dos lobistas voltou-se para o Legislativo, onde contam com importantes aliados. Parlamentares, principalmente os das bancadas do agronegócio e empresarial, têm ecoado o discurso da indústria.

“Ultraprocessado não quer dizer que é totalmente ruim”, defendeu o deputado federal Joaquim Passarinho (PL-PA), membro do grupo de trabalho da Reforma Tributária, que analisa o projeto do Executivo, e presidente da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE). No entanto, uma pesquisa do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (Nupens/USP) associa o consumo de ultraprocessados à morte de 57 mil pessoas por ano e há vários estudos que comprovam os malefícios desses alimentos.

“Você pode acabar com um produto, você pode acabar com uma marca, se você começar a taxá-la”, argumentou o deputado, que recebeu recentemente em seu gabinete representantes de fabricantes de refrigerantes. A Pepsico, segundo ele, teria reclamado do fato de sua água de coco ter sido classificada como uma bebida com adição de açúcar e, portanto, incluída no imposto seletivo, assim como os refrigerantes açucarados – as bebidas com zero adição de açúcar não serão taxadas pelo “imposto do pecado”.

Passarinho ainda defendeu que a educação alimentar “vem de berço” e que o “refrigerante não é o culpado da obesidade do Brasil”. Para embasar o argumento, durante entrevista à Pública, tirou da bolsa um folheto fornecido pela Coca-Cola que reproduz dados de um estudo que diminui o papel da alimentação na obesidade, realizado por economistas da Fundação Getulio Vargas, contestado à época e cujos financiadores não foram divulgados.

Ainda que tenha reproduzido os argumentos da indústria de bebidas açucaradas, o deputado afirmou que seu compromisso [no grupo de trabalho] seria apenas com a inclusão das carnes vermelhas na cesta básica. Para o deputado, o que tem ocorrido no Congresso é o “lobby oficial e legal”. “Eles têm o direito de pedir, nós temos o direito de negar”, resumiu.

Na última campanha, Passarinho recebeu R$ 50 mil de doação do empresário da indústria da carne Roberto Resende Paulinelli, dono da Friguaçu e do Frigorífico Rio Maria.

Folheto que o deputado Joaquim Passarinho disse ter recebido de representante da Coca-Cola que usa partes verdadeiras de estudos para levar a conclusões falsas ou distorcidas sobre a nutrição humana e tenta isentar os refrigerantes do papel de impacto na obesidade e na pobreza nutricional. Os argumentos apresentados pela indústria são contestados por profissionais da saúde e estudiosos Folheto que o deputado Joaquim Passarinho disse ter recebido de representante da Coca-Cola usa partes verdadeiras de estudos para levar a conclusões falsas ou distorcidas sobre a nutrição humana para tentar isentar os refrigerantes do papel de impacto na obesidade e na pobreza nutricional. Os argumentos apresentados pela indústria são contestados por profissionais da saúde e estudiosos

Cesta básica, a atual “galinha dos ovos de ouro”

A pressão da indústria de alimentos e do agronegócio sobre o Congresso Nacional é para incluir os ultraprocessados na cesta básica, o que os isentaria de impostos. Atualmente, a proposta de isenção do governo federal é direcionada, em sua maior parte, a produtos in natura ou minimamente processados, mas também já contempla produtos como margarina, fórmulas infantis e massas alimentícias.

“Foi mantido o critério de priorização de alimentos saudáveis”, assegurou Rodrigo Orair, diretor de programa da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária e um dos responsáveis pela formulação do projeto do governo. Ele avalia que a decisão será “política”. “Quem vai decidir é o Parlamento. O que tem que saber é a consequência dessas decisões”, afirmou em entrevista à Pública.

Lobistas trabalham para ampliar a lista. Entre os alimentos defendidos estão as carnes, incluindo as ultraprocessadas, como salsicha, mortadela e linguiça, citadas pela Associação Brasileira de Supermercados (Abras) em audiência pública sobre a Reforma Tributária no último dia 5 de junho na Câmara. “Carnes são essenciais para o consumo das famílias brasileiras”, argumentou Marcel Caparoz, representante do grupo na reunião.

“A salsicha, que é a proteína mais barata que a população pobre tem acesso, não deveria estar na cesta básica?”, concordou o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), João Dornellas, que também participou da audiência na Câmara. Em 2015, o alimento foi incluído pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na lista do grupo 1 de produtos que causam câncer, em que estão também tabaco, amianto e fumaça de diesel.

Rodrigo Orair, diretor de programa da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária, fala em audiência pública sobre cashback e cesta básica e demais alimentos na Câmara dos Deputados

“Eu acho absurdo a indústria colocar na mesa que quem é pobre tem que comer qualquer coisa”, avaliou a nutricionista Ana Maria Maya, do Programa de Alimentação Saudável e Sustentável do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec). “Isso coloca a população mais vulnerável em uma situação de maior vulnerabilidade ainda, porque está favorecendo o consumo de alimentos que a gente sabe que vão ter um impacto negativo na saúde”, concordou Ana Paula Bortoletto, pesquisadora do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (Nupens/Usp).

Quem detém a faca e o queijo

Nessa etapa da regulamentação da Reforma Tributária, sete parlamentares escolhidos pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidirão sobre os itens que vão entrar na cesta básica. Eles compõem o grupo de trabalho cujas sugestões seguirão para avaliação do plenário da Casa.

Quatro dos sete deputados do grupo são da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA): Augusto Coutinho (Republicanos-PE), Moses Rodrigues (União-CE), Claudio Cajado (PP-BA) e Luiz Gastão (PSD-CE). Três deles, Cajado, Gastão e Joaquim Passarinho, também fazem parte da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE). Gastão e Passarinho ainda pertencem à Frente Parlamentar do Comércio, Serviços e Empreendedorismo (FCS). Completam o grupo Hildo Rocha (MDB-MA) e Reginaldo Lopes (PT-MG).

Ao lado de Passarinho, Cajado é um dos subscritores do Projeto de Lei Complementar (PLP) 35/2024, proposto pela bancada do agronegócio, que busca adicionar à lista da cesta básica “biscoitos, bolos e misturas próprias” e “molhos preparados”, categorias que também incluem ultraprocessados. O projeto, apresentado em reunião-almoço da FPA, foi um dos 13 protocolados por uma coalizão de 24 frentes parlamentares sobre a reforma.

Em entrevista à Pública, o deputado afirmou que não tem um lado na discussão, mas que “se tivesse, não diria agora”. “Esse cabo de guerra, o que fica, o que pode ser alterado, é fruto de um debate intenso”, acrescentou. O político disse que assinou o PLP 35 a pedido de um colega, sem dar detalhes.

Deputado Claudio Cajado, integrante do GT da Reforma Tributária

Já o deputado Augusto Coutinho (Republicanos-PE) defendeu que “o setor de alimentos é fundamental” e que “o agro é quem tem alavancado o nosso país”, mas que “não tem ainda definição [sobre os ultraprocessados]”.

“Nós estamos trabalhando dentro de uma harmonia muito grande, de todos os membros do grupo, mas principalmente buscando consenso do que é possível para que a gente possa fazer um texto conjunto”, acrescentou Luiz Gastão. “Todas as reivindicações são lícitas”, observou.

Como a prática do lobby ainda não é regulamentada no Brasil, não há transparência nem obrigatoriedade do registro dos contatos de lobistas com órgãos estatais e parlamentares. No final de 2022, a Câmara aprovou, a toque de caixa, o Projeto de Lei (PL) 1.202/2007, que aborda o tema. O texto aprovado pelos deputados agora tramita no Senado. Porém, conforme mostrou a Pública, pode dificultar a fiscalização de possíveis abusos.

Concorrentes nas prateleiras, parceiras no lobby: quem influencia a mesa do brasileiro

As associações são importantes atores na articulação política. Quem representa as empresas de bebidas açucaradas, por exemplo, é a Associação Brasileira de Refrigerantes (Abir), presidida pelo diretor de relações governamentais da Coca-Cola, Victor Bicca Neto. Ele também ocupa a vice-presidência do conselho diretor da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), que, além da Coca e da Pepsico, conta com 110 associados, como Unilever, Nestlé, Ambev, Seara, Cargill, Garoto e McDonald’s.

A Abia é presidida por João Dornellas, que lidera as articulações do setor, de acordo com várias fontes ouvidas pela Pública. Ele trabalhou por quase 23 anos na Nestlé e atualmente é membro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial do Ministério de Desenvolvimento Indústria e Comércio (Mdic) e do Conselho Superior do Agronegócio da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp).

Dornellas contou que “tem conversado com todos os parlamentares” e também com ministros e secretários. “A gente tem sido bem recebido. Acho que, democraticamente, todo mundo tem que defender o seu ponto de vista. A indústria defende o seu ponto de vista e temos sido bastante ouvidos”, ressaltou em entrevista à reportagem.

Com o objetivo de aumentar a influência sobre o texto da Reforma Tributária e atrair apoio da opinião pública, quatro entidades que representam as maiores empresas de alimentos e bebidas do país lançaram em abril a União Nacional da Cadeia Produtiva de Alimentos e Bebidas (Uncab).

A organização reúne, além da Abia e da Abir, as associações das indústrias de chocolates, amendoim e balas (Abicab) e de biscoitos, massas, alimentos, pães e bolos industrializados (Abimapi). “Mas por que nós criamos isso? Porque exatamente nós temos interesse em ter um discurso muito parecido, muito similar, porque todos nós produzimos alimento para o ser humano”, afirmou João Dornellas. Com bom trânsito no Legislativo e no governo federal, ele foi o escolhido para presidir a nova iniciativa.

Segundo Dornellas, desde a fundação, outras entidades já se associaram à Uncab, como a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) e a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). “Nós defendemos que todo alimento pague menos imposto. O alimento da feira livre, da quitanda e o do supermercado, todo alimento deveria pagar menos imposto”, ressaltou.

De acordo com a Abia, a indústria dos alimentos tem faturamento anual superior a R$ 1 trilhão e responde por cerca de 10,8% do PIB nacional. Juntas, as empresas do setor empregam 1,97 milhão de trabalhadores diretos.

Brasil gasta R$ 8,2 milhões por dia para tratar danos de ultraprocessados à saúde

O consumo de ultraprocessados tem gerado custos à saúde pública brasileira. Conforme destacou a diretora do Departamento de Análise Epidemiológica e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis do Ministério da Saúde, Letícia Cardoso, em audiência na Câmara, o Brasil tem gastado R$ 3 bilhões ao ano com internações no SUS e com tratamentos de doenças relacionadas a bebidas ultraprocessadas.

A Uncab informa em seu site que tem entre seus objetivos “desmistificar a ideia de que a indústria de alimentos e bebidas é a vilã da alimentação nacional”. O grupo contesta a classificação de alimentos “ultraprocessados” e utiliza o termo “industrializados” no lugar.

O coordenador de advocacy da ACT Promoção da Saúde, Marcello Baird, aponta “que não há dúvida dos malefícios causados pelos ultraprocessados”.“O termo ultraprocessado surgiu pioneiramente aqui no Brasil em 2009, ele foi difundido pelo mundo e agora, passados 15 anos, ele está bastante estabelecido já na ciência”, acrescentou.

De acordo com o guia alimentar para a população brasileira, os ultraprocessados são “desbalanceados nutricionalmente” e “devem ser evitados”. O guia foi publicado pelo Ministério da Saúde em 2014 após intensa pressão contrária da mesma indústria que hoje busca convencer os parlamentares de que os produtos “não são tão ruins assim”.

Para o deputado Padre João (PT-MG), que tem articulado com a sociedade civil para barrar os benefícios aos ultraprocessados, a indústria de alimentos precisa mudar de estratégia. “Toda essa força-tarefa que eles fazem, eles poderiam concentrar esses esforços para buscar uma alimentação saudável, produtos mais saudáveis. Eles querem falar que a gente é contra a indústria. Não é contra, não. Eles têm que ser responsáveis, consequentes, para promover a saúde das pessoas”, afirmou à Pública.

Uncab: influência antes mesmo de “existir”

Um coquetel realizado em Brasília na noite de 17 de abril de 2024 marcou o lançamento da Uncab. “A indústria de alimentos e bebidas não alcoólicas está na mesa e na vida dos brasileiros”, dizia o panfleto distribuído aos convidados, com o mote da campanha da organização.

Entre os presentes no evento estava o deputado federal Luiz Carlos Hauly (Pode-PR), indicado por Arthur Lira para integrar um segundo grupo de trabalho da Reforma Tributária que abordará temas como o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), novo tributo estadual e municipal. Procurado, o parlamentar disse que participa de muitos eventos por dia e não se lembra especificamente do realizado pela Uncab.

Antes mesmo do lançamento, o nome da Uncab já aparecia na agenda de atores do governo federal envolvidos no texto da regulamentação da Reforma Tributária. Em 13 de março de 2024, representantes da organização foram recebidos pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e por Bernard Appy, mentor da proposta enviada ao Congresso. Dirigentes das quatro associações que fundaram o grupo empresarial participaram da reunião, entre eles Dornellas e Bicca Neto.

A Pública solicitou a ata e gravações do encontro via Lei de Acesso à Informação (LAI), mas o Ministério da Fazenda retornou apenas com o nome dos participantes – informação que não havia sido requerida, uma vez que a agenda dos servidores do alto escalão é pública. A Pública recorreu, mas ainda não obteve retorno.

Às vésperas de o projeto de regulamentação da reforma ser enviado à Câmara dos Deputados, representantes da Uncab também estiveram no Ministério da Saúde. No dia 11 de abril de 2024, eles se reuniram com o secretário de Atenção Primária à Saúde, Felipe Proenço de Oliveira, e com o chefe da Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares e Federativos da pasta, Chico D’Angelo. Não houve gravação nem confecção de ata, conforme informou o ministério por meio de LAI.

Procurados, os ministérios da Saúde e da Fazenda não responderam quais foram os assuntos debatidos nas reuniões com a Uncab.

O conceito de “comida de verdade” que vai além da publicidade

Para divulgar a nova iniciativa, a Uncab patrocinou conteúdos em grandes veículos de notícia brasileiros, como o portal G1 Distrito Federal, do Grupo Globo, e o jornal O Estado de S.Paulo. Os textos publicados foram identificados como conteúdos publicitários e assinados pela organização.

Na publicação patrocinada do Estadão, em 23 de abril, a Uncab informa que foi criada para “questionar, por exemplo, o aumento de impostos e a não elevação da carga tributária sobre alimentos e bebidas não alcoólicas”. “Estamos vivendo um ano desafiador pela discussão da Reforma Tributária no Congresso. Lutar contra o aumento de impostos significa defender o acesso democrático aos alimentos”, diz no texto o presidente executivo da Abicab, Jaime Recena.

A ideia defendida pela indústria, no entanto, vai na contramão do direito humano à alimentação saudável, na avaliação de fontes ouvidas pela reportagem. “Nós queremos acabar com a fome com comida de verdade, não é com qualquer comida, e comida de verdade não inclui ultraprocessado”, afirmou a secretária nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do MDS, Lilian Rahal.

Os textos da Uncab publicados no Estadão e no G1 também criticam a classificação dos alimentos pelo grau de processamento industrial. De acordo com uma declaração de João Dornellas reproduzida nos dois conteúdos, o conceito de ultraprocessado “não encontra consenso científico nacional ou internacional” e seria “constrangedor que venham pedir aumento de imposto sobre qualquer tipo de alimento”.

Ana Maria Maya, do Idec, rebate o argumento do presidente da organização. “A gente não está falando de taxar qualquer alimento, a gente está falando de taxar produtos que adoecem as pessoas e o meio ambiente, que pioram os desastres climáticos”, afirmou a nutricionista em entrevista à Pública.

Segundo ela, é necessário “tornar mais acessível o que é comida de verdade, que alimenta as pessoas de verdade; que é arroz, feijão, frutas e hortaliças; que é a cultura alimentar das pessoas, que traz saúde para a mesa das pessoas”.

Ana Paula Bortoletto, pesquisadora do Nupens/USP, acrescenta que é natural que o conhecimento científico seja questionado, mas que as críticas da indústria “costumam ser sem nenhum tipo de argumento ou comprovação científica, e vindo de pesquisadores que têm conflitos de interesses com a indústria”.

Empresas admitem que cultura de alimentação saudável ameaça mercado tradicional

O discurso “pelo bem social” da indústria muda de tom nos relatórios de risco produzidos pelas empresas aos seus acionistas no mercado financeiro. De acordo com os documentos, as companhias temem que mudanças para hábitos mais saudáveis de vida e alimentação prejudiquem seus negócios.

“O foco global contínuo na saúde e no bem-estar, incluindo o controle de peso, o aumento da atenção que a mídia dedica ao papel do marketing de alimentos e a cobertura negativa da mídia sobre os controles de qualidade e produtos da Companhia, podem afetar negativamente a imagem da marca da Companhia ou levar a regulamentações mais rígidas e um maior escrutínio das práticas de marketing de alimentos”, apontou a BRF em relatório publicado no mês passado.

Associada da Abia, a BRF é uma das maiores companhias de alimentos do mundo, com mais de 30 marcas em seu portfólio, entre elas Sadia, Perdigão e Qualy. O mesmo documento cita a mudança na rotulagem de alimentos aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) após anos de pressão da indústria. A nova regra obriga que produtos com níveis altos de sódio, açúcar adicionado e gorduras saturadas apresentem alertas na parte frontal dos rótulos.

“Em outros países da América Latina onde esses tipos de regulamentação relacionada à saúde já estão em vigor, a Companhia notou que o volume de vendas de alimentos processados foi afetado adversamente e o mesmo pode ocorrer no mercado brasileiro”, aponta o relatório de risco da BRF.

A JBS, empresa brasileira dona de marcas como Swift e Seara, também associadas da Abia, alerta seus acionistas de que “mudanças nas preferências do consumidor podem prejudicar o negócio da Companhia”.

“Percepções negativas prolongadas em relação às implicações para a saúde de certos produtos ou ingredientes alimentares ou perda de confiança no sistema de segurança alimentar em geral, podem influenciar as preferências do consumidor e a aceitação de alguns dos produtos e programas de marketing da Companhia”, diz a JBS no relatório da empresa em maio passado.

Procuradas, a BRF e a JBS não se manifestaram sobre o conteúdo de seus relatórios ou se investiriam em projetos para colaborar com o consumo de produtos mais saudáveis.

Direito, desigualdade e desequilíbrio

Na avaliação da pesquisadora Ana Paula Bortoletto, o “sistema alimentar” defendido pela indústria, modelo no qual os ultraprocessados seriam colocados, “olha para a alimentação muito mais como uma commodity do que como um direito”.

“[É um sistema que] não valoriza as formas de trabalho e as relações sociais das pessoas que trabalham, principalmente na produção agrícola, mas também em toda a cadeia de produção e distribuição de alimentos. Não são apenas os produtos em si, é toda uma lógica de estimular o consumo excessivo”, afirmou.

Um levantamento feito pela ACT Promoção da Saúde mostra que, de 2006 a 2022, o preço dos alimentos teve um aumento 70% maior que o da inflação geral (IPCA). Ainda nesse contexto, de acordo com a coordenadora da Campanha sobre Alimentação Saudável da organização, Marília Sobral Albiero, o preço médio dos alimentos saudáveis ainda teve elevação quase três vezes superior ao de ultraprocessados. “Você tem uma competição desleal e a gente sabe que o preço impacta nas nossas decisões de compra”, ressaltou.

“No sistema atual, a alimentação saudável tem um tratamento igual ou pior ao do produto ultraprocessado”, acrescentou. Como exemplo, destacou que, hoje, em alguns estados, nuggets e salsichas têm a mesma carga tributária do arroz e do feijão.

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A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou, nesta terça-feira (18), a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra os supostos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, e da tentativa de homicídio da assessora parlamentar Fernanda Chaves, ocorridos em março de 2018.

Todos os cinco ministros que compõem o colegiado votaram pelo recebimento da denúncia. Flávio Dino, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Carmen Lúcia acompanharam integralmente o voto do relator, o ministro Alexandre de Moraes.

Nessa fase, a Turma analisa se a denúncia atende aos requisitos legais e se há indícios do cometimento do crime e de sua autoria. O julgamento é realizado pelo STF, devido ao foro privilegiado de Chiquinho Brazão, que é deputado federal pelo Rio de Janeiro.

Com o recebimento da denúncia pelo Judiciário, os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão, o ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro Rivaldo Barbosa, além de Ronald Paulo Alves de Paula, major da Polícia Militar, e Robson Calixto Fonseca, ex-assessor de Domingos Brazão se tornam réus e enfrentarão ação penal pelos crimes.

Na apresentação da denúncia, o subprocurador-geral da República, Luiz Augusto Santos Lima, afirmou haver substantiva materialidade das acusações apresentadas, pelo que defendeu a abertura da ação penal contra os acusados.

"Considerando todos os elementos de convicção já referidos, há indício suficiente de autoria, expostos de maneira individualizada em relação a cada um dos imputados nesta etapa processual. É o que basta para se reconhecer justa causa à ação penal", defendeu.

O subprocurador fez um alongado relato dos crimes praticados pelos irmãos Brazão, sua relação com as milícias e com o controle de territórios por organizações criminosas em diversas regiões do Rio de Janeiro. E destacou que o homicídio de Marielle e de seu motorista teria sido motivado pela forte atuação da parlamentar contrária aos interesses da organização.

"Desde meados de 2008 até os dias atuais, tais indivíduos integram uma ação criminosa armada, instalada na capital do estado do Rio de Janeiro, voltada à prática continuada dos crimes de parcelamento irregular do solo, com finalidade de lucro, (...) além de outros delitos violentos necessários à continuidade de suas atividades ilícitas", relatou.

Defesa tenta obstaculizar julgamento e é repreendida por Moraes

A defesa dos acusados alegou que o STF não deveria ser responsável por julgar o caso, já que os supostos crimes teriam sido cometidos antes da obtenção do mandato parlamentar pelo acusado com foro, o deputado Chiquinho Brazão.

Sobre esse aspecto, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que, embora reconheça a anterioridade do crime de homicídio, há fortes indícios de posterior utilização do poder de influência como deputado federal para obstruir as investigações, o que justifica manter o julgamento pelo STF.

"A investigação de obstrução e a própria organização criminosa estão relacionadas ao mandato de deputado federal. Não há como possibilidade de obstruir se não houver poder de influência", disse o ministro.

Moraes afastou ainda a arguição de suspeição do ministro Flávio Dino, levantada pela defesa dos acusados, pelo fato de o magistrado haver exercido o cargo de Ministro da Justiça e Segurança Pública à época da denúncia apresentada pela PGR.

Em dado momento, Moraes repreendeu a defesa por haver alegado o cerceamento da defesa, por supostamente não ter tido acesso aos autos de forma integral.

"Não é cabível que um advogado venha aqui nesta tribuna e diga que não tenha tido acesso a todos as provas do processo. Isso é um absurdo processual", reclamou o ministro.

Os réus

Chiquinho Brazão é deputado federal pelo Rio de Janeiro, eleito pelo União Brasil e expulso no partido depois de ser preso em março, durante a Operação Murder, Inc., deflagrada pela PGR, Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) e Polícia Federal (PF). Ele é acusado de homicídio qualificado e tentativa de homicídio.

Domingos Brazão, irmão de Chiquinho, é ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, preso durante a mesma operação, no mês de março. Sobre eles, pesa a acusação de envolvimento em organização criminosa, homicídio qualificado e tentativa de homicídio.

Rivaldo Barbosa era o chefe da Polícia Civil do RJ na data do assassinato de Marielle. Ele é acusado de haver sugerido o modus operandi do assassinato, em busca de encobrir os assassinos, pelo que responde por homicídio qualificado e tentativa de homicídio.

Ronald Paulo Alves de Paula, major da PM é acusado de haver monitorado os passos de Marielle, e Robson Calixto Fonseca, ex-assessor de Domingos Brazão, de fornecer a arma utilizada no assassinato.

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O linguista, cientista político e filósofo Noam Chomsky, de 95 anos, recebeu alta no Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo (SP) nesta terça-feira (18). Mais cedo, um boato sobre a morte do intelectual circulou pela imprensa e nas redes sociais.

Chomsky sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) massivo há um ano e estava internado no Brasil, onde deve seguir o tramento em casa. O país foi adotado como segundo lar pelo pensador de esquerda em 2015, após seu casamento com a linguista brasileira Valeria Chomsky.

Considerado o fundador da linguística moderna, Chomsky é autor de mais de 100 livros publicados e se classifica como socialista libertário. Com intensa atividade acadêmica, é professor emérito do Instituto de Tecnologia de Massachussetts (MIT, na sigla em inglês), onde lecionou por mais de 40 anos. Sua combativa atuação política e intelectual influenciou a esquerda em todo o mundo.

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"A América Latina não quer mais guerra. O que ela quer é a construção da paz o mais rápido possível", disse o Presidente colombiano nesse sábado,15.

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Os líderes do G7 prometeram combater o que chamaram de "práticas comerciais injustas da China". Eles citam preocupações internas com as indústrias nacionais e a manutenção dos empregos dos trabalhadores.

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A Câmara dos Deputados surpreendeu muitos ao impulsionar a discussão de um projeto de lei que equipara o aborto ao homicídio e proíbe o aborto mesmo em casos de estupro.

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O Papa Francisco apelou à proibição de “armas letais autónomas” na sexta-feira, tornando-se o primeiro pontífice a dirigir-se ao G7 com um discurso sobre os perigos da IA.

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A revolução segundo Judith Butler (piaui.folha.uol.com.br)
submitted 9 months ago by Gh_stt to c/bunkerdaesquerda
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submitted 9 months ago* (last edited 9 months ago) by DomRodrigues@lemmygrad.ml to c/bunkerdaesquerda
 
 

Uso o telegram para ver notícias em canais árabes e russos geralmente sobre as guerras Rússia-Ucrânia e Israel-Hamas, hoje maioria dos canais árabes pró-Hamas não abriram e aparecia uma notificação de que o Telegram da play store não permitia o conteúdo ou algo do tipo, então tive a idéia de visitar o site oficial do app e baixar direto, problema resolvido.

Esse é mais um exemplo de como as redes e as big techs utilizam de seu poder para influenciar politicamente o mundo favorecendo àqueles que mais lhe agrada.

https://telegram.org

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O famoso "arroz do governo" está sendo vendido a R$ 4 o quilo. Não consigo entender a discrepância nos preços.

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