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Notícias

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A Dakila Pesquisas, empresa acusada de irregularidades e de praticar pseudociência, foi chamada pelo governo bolsonarista de SP para participar oficialmente de atividades turísticas do Caminho do Peabiru, através de um protocolo de intenções assinado dias atrás.

O documento, cujo gasto/preço/verba é desconhecido, foi firmado entre o secretário paulista de Turismo e Viagens, Roberto de Lucena (amigo do ator Mário Frias, inculto ex-secretário de Cultura de Bolsonaro) e o diretor da Dakila, Urandir Fernandes. Este é chamado jocosamente por algumas mídias como “ET Bilu”, devido a uma personagem desmascarada na TV vários anos atrás.

A Sociedade de Arqueologia Brasileira (SAB) vem acompanhando as práticas da empresa, anticientíficas e desqualificadoras, há algum tempo. E acabou de divulgar em 16 de maio, em seu site, um dossiê sobre diversas anormalidades envolvendo o grupo Dakila, entre elas a defesa da presença de discos voadores e seres extraterrestres no Brasil.

O Peabiru é um caminho milenar indígena que ligava o oceano Atlântico ao Pacífico, com cerca de 4 mil quilômetros de extensão. Passava por SP, PR, SC, (RS, possivelmente) e MS. Cruzava também o Paraguai, Bolívia, Argentina, Peru e Chile.

Preocupando a Arqueologia

A seguir apresentamos o dossiê, resumido e adaptado (em tipologia itálica):

O presente dossiê foi elaborado pelo Associado:

Prof. Dr. Artur Henrique Franco Barcelos/Historiador e Arqueólogo/Docente do Bacharelado em Arqueologia/Programa de Pós-Graduação em Geografia PPGEO/Universidade Federal do Rio Grande – UFRG.

A Dakila Pesquisas e as licenças para pesquisas arqueológicas na Amazônia brasileira

Esse breve dossiê se fez necessário pelo fato de a empresa Dakila Pesquisas, parte do Ecossistema Dakila, ter protocolado no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, uma solicitação em 2023 para realizar pesquisas arqueológicas na região do munícipio de Apiacás, MT. Esse dossiê é precedido de um resumo histórico dessa empresa, seu fundador, seus objetivos e as teses que propaga desde ao menos os anos 1990.

Por tratar-se de um conjunto de teses e ideias que confrontam o conhecimento científico acumulado pela Arqueologia, História, Geologia, Geografia, Astrofísica, Antropologia, Biologia, entre outras, preocupa o fato de que essa empresa possa, através de algum arqueólogo(a) integrante de sua equipe, vir a receber licença para pesquisas arqueológicas.

Enfrentando o burlesco

O caso da Dakila Pesquisas, por mais que possa parecer caricato ou burlesco em alguns momentos, explicita a necessidade de se discutir com mais ênfase o enfrentamento da anticiência, negaciocionismo e presença no ambiente acadêmico de pseudopesquisadores.

Ratanabá e ET Bilu e charlatanismo

Desde 2021 um assunto passou a interessar ao grande público e a Arqueologia brasileira, a notícia de que haveria sido descoberta uma grande cidade perdida na Amazônia chamada Ratanabá. Com o passar dos meses foi ficando claro que o idealizador era Urandir Fernandes de Oliveira, ufólogo conhecido no país desde os anos 1980. Ele esteve envolvido em um dos episódios mais caricatos da Ufologia que foi o contato, em 2010, com uma entidade extraterrestre chamada ET Bilu, transmitida ao vivo pela Rede Record de TV. A matéria levantou a possibilidade de a proposta de Urandir ser caracterizada como charlatanismo.

Apesar disso, negócios crescem

Após o episódio “ET Bilu”, Urandir saiu dos noticiários. Mas suas atividades não pararam. Ao contrário, seus negócios cresceram em larga escala. Ele criou a empresa Dakila Pesquisas, que passou a se apresentar em 2021 como Ecossistema Dakila. Este atua em diversos setores, tais como imobiliário, cosméticos, mineração, criptomoedas, etc.

Para a Arqueologia brasileira interessa particularmente a Dakila Pesquisas. Foi no âmbito desta que, em 2021, a Dakila anunciou a existência de Ratanabá, uma suposta cidade antiga, até então desconhecida, cujas ruínas ou entrada ficariam no Norte do Estado do MT, fronteira com o PA, município de Apiacás.

Absurdo de milhões de anos

(OBS de AND: Apesar de a hipótese científica mais aceita é de que a origem dos seres humanos deu-se há apenas cerca de 200 mil anos) é afirmado em textos do site de Dakila: “Ratanabá foi a primeira Capital do Mundo. A civilização dos Muril foi a primeira que chegou na terra há 600 milhões de anos atrás. Os Muril ficaram aqui até um pouco antes da elevação dos Andes, por volta de 450 milhões de anos atrás. Se estabeleceram por um período de 150 milhões de anos mapeando e demarcando o nosso planeta. O objetivo deles não era colonizar, porém trouxeram pessoas para ajudar no seu trabalho. Como nosso planeta era muito bonito, muitos dos trabalhadores e descendentes diretos dos Muril escolheram ficar na Terra.” (site do Ecossistema Dakila)

Ator Mário Frias caiu no papo, diz revista

Em 2020, o então Secretário Nacional de Cultura (do bolsonarismo) Mário Frias, declarou na rede Twitter (X) que havia recebido Urandir para ouvir o relato sobre a descoberta de Ratanabá:

“Ele me apresentou um documento que resume os estudos iniciados pela associação desde 1992, ano em que Ratanabá teria sido descoberta. Vi diversas fotos de artefatos bem elaborados de metal e de cerâmica encontrados em galerias subterrâneas no Real Forte Príncipe da Beira no município de Costa Marques, em Rondônia. “Sureal? (sic) Vamos aguardar as imagens da tecnologia e depois os resultados das expedições terrestres antes de tirarmos conclusões”. (revista Veja, 2022)

Mistura de alhos e bugalhos

Naquela ocasião se ficou sabendo que Urandir e equipe haviam estado no Real Forte Príncipe da Beira, (patrimônio protegido pelo IPHAN, com parte fechada a visitas). Num vídeo posterior ele apresentou teoria de que o IPHAN estaria atuando com a ONU e a UNESCO, “orgãos internacionais que querem tomar a Amazônia do Brasil.”

Em outro vídeo está um resumo da tese geral, segundo a qual existiriam túneis e galerias subterrâneas, bem como linhas magnéticas, interligando vários lugares do mundo a Ratanabá. Incluindo o Forte Príncipe da Beira e as Missões Jesuíticas dos Guaranis, cujas ruínas se encontram no Brasil, Argentina e Paraguai.

Sem rigor cientifico

Estamos diante de afirmações que carecem de rigor científico. Em que pese o fato da Dakila Pesquisas utilizar métodos e ferramentas que a Arqueologia também utiliza, como prospecções, sensoriamento remoto, LiDAR, etc., suas premissas carecem de fundamentação que as corroborem.

A tese geral (sobre Ratanabá) não tem respaldo em dados da Geologia, Biologia, Paleontologia, Astrofísica, Arqueologia, Antropologia, História ou qualquer outro ramo das ciências.

Presença de extraterrestres e Terra Plana

(Em alguns casos, a Dakila defende que) a humanidade é mais antiga (do que se diz comumente) e é o resultado de intervenção extraterrestre.De maneira geral, tratam-se de teorias que negam o conhecimento científico acumulado até os dias atuais. No caso de Urandir e Dakila há ainda a crença na teoria da Terra Plana, como é possível ver no documentário Terra Convexa (2018), produzido pelo grupo.

Peabirus, Reinos Energéticos e o governo Tarcisio

(Resumindo a tese da Dakila e Urandir se poderia dizer que) A Terra foi habitada em um passado remoto, entre 600 e 400 milhões de anos, por um povo chamado Muril vindo de outro planeta ou outra dimensão. Seus descendentes fundaram cidades e reinos. Pouco restou daquele período. Havia conhecimento para usar de linhas de energia e vortex, sobre os quais depois foram propositalmente construídas estruturas mais novas.

Exemplos disso seriam os Peabirus, velhos caminhos indígenas que, na verdade são da época dos “Reinos”. (OBS de AND: foi com tal ótica destrambelhada que o governo bolsonarista de SP se aliou para implementar um projeto turístico peabiruano na versão da chamada extrema-direita.)

Deputado apela em favor da empresa

Desde 2021, a Dakila Pesquisas vem tentando conseguir uma autorização do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional IPHAN para realizar pesquisas arqueológicas na região onde acreditam estar Ratanabá.

(Em um dos processos) consta que o então Deputado Federal Ricardo Barros (Progressistas/PR) pediu ao IPHAN atenção à solicitação da DAKILA em 29 de março de 2021. (OBS de AND: O bolsonarista Barros esteve envolvido em um dos escândalos apurados pela CPI da COVID. O IPHAN, como resposta, mostrou que o pedido da Dakila continha erro primário de formulação.)

Através de Ofício o IPHAN enviou a Dakila as informações de como são feitas as solicitações de pesquisas arqueológicas.

IPHAN e cientistas reagem

(OBS de AND: Respondendo a uma outra petição da Dakila, o IPHAN exarou um Parecer Técnico negando o pedido porque o suposto arqueólogo da Dakila, que assinou o documento, não possuía a qualificação informada.)

“O Sr. Saulo Ivan Nery indicado no projeto como coordenador geral e de campo não possui graduação ou pós graduação em arqueologia. Assim sendo, faz-se necessário apresentação de cópia das publicações cientificas que comprove a idoneidade técnico-científica e atuação.”

Em dezembro de 2023 os arqueólogos Igor Chmyz, Julio C. Thomaz, Cláudia Inês Parellada e Almir Pontes Filho, do Paraná, assinaram “Carta Denúncia da Comunidade Científica”, tratando das atividades pseudocientíficas da equipe de Dakila no Estado.

(OBS de AND: Sobre o assunto, o portal AND publicou a seguinte reportagem em 15 de janeiro de 2024: A ciência reage contra incas e ETs.)

Em resposta a esta denúncia, o IPHAN, através do setor de Articulação e Gerenciamento de Dados, em 12/04/2024, destacou:

“…faz-se necessário diligenciar a remessa ágil e sistemática das denúncias substanciadas, como esta (paranaense),à Superintendência Estadual da PF, com vistas à abertura de inquérito policial.”

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